A cirurgia parendodôntica é um procedimento cirúrgico realizado para eliminar o agente etiológico de um processo inflamatório periapical, utilizado como uma opção de tratamento, quando o procedimento endodôntico conservador falhou (BRAMANTE;BERBERT, 1990). É um procedimento específico e tem suas indicações e contra-indicações, o diagnóstico clínico e achados radiográficos e tomográficos, quando bem estabelecidos e executados previamente ao ato operatório irão favorecer o resultado final, promovendo desta forma, a preservação da permanência do elemento dentário em questão, na cavidade oral do paciente. Sendo indicada somente quando todas as possibilidades de terapia endodôntica convencional estiverem esgotadas.

No tratamento endodôntico, em casos de insucesso, eliminando-se as causas iatrogênicas (inexperiência do profissional, técnicas incorretas, perfurações, fraturas de instrumental, extravasamento de material, etc…), há os casos relacionados ao dente em questão como: canais atrésicos e calcificados, curvaturas radiculares, em processo de rizogênese, canais e raiz extranumerários, dificultando então o selamento de todas as vias de proliferação bacteriana do sistema de canais radiculares, não promovendo a neutralização e diminuição necessária da flora bacteriana.

Após ou concomitantemente à necrose pulpar, ocorre a contaminação bacteriana, desenvolvendo-se uma patologia denominada gangrena pulpar, que leva a inflamação do periodonto apical (periodontite apical ou pericementite). A periodontite apical pode ser aguda ou crônica. Quando aguda pode evoluir para um abscesso dento alveolar agudo, e quando crônica, para um granuloma e/ou cisto periapical, abscesso crônico. Um processo crônico pode agudizar e apresentar os mesmo sintomas e sinais de um abscesso dento alveolar agudo, com a diferença que na radiografia a imagem apresentará uma lesão periapical, que nesses casos é chamado de abscesso fênix (SAYÃO, 2007).

Indicações para a cirurgia periapical

Problemas anatômicos que impedem completo desbridamento ou obturação

 Calcificações ou outros bloqueios, acentuadas curvaturas radiculares que podem comprometer o tratamento radicular.

A: Curvatura radicular grave B: Resseção apical e obturação retrógrada com M.T.A (agregado de trióxido mineral) C: 4 meses após cirurgia com regeneração óssea (Fonte: HUPP et al, 2015)

Considerações restauradoras que comprometem o tratamento

 Dente restaurado com pino irrecuperável e coroa com patologia apical.

Pino irrecuperável e patologia apical (Fonte: HUPP et al, 2015)

Fratura radicular horizontal com necrose apical

O segmento apical após fratura radicular traumática é cirurgicamente removido após o tratamento do canal na porção coronária.

A: Fratura radicular horizontal B: Remoção do segmento cirurgicamente e obturação retrógada C: Cicatrização após um ano (Fonte: HUPP et al, 2015)

Material irrecuperável que impede o tratamento ou retratamento do canal

Bloqueio dos canais por objetos, como instrumentos quebrados, materiais restauradores, segmentos de pinos ou outros objetos estranhos.

A: Instrumento irrecuperável fraturado no canal mesiovestibular
B: Ressecção da raiz com instrumento fraturado seguido de selamento com obturação retrógrada
(Fonte: HUPP et al, 2015)

Erros de procedimentos durante o tratamento

Quando ocorre a quebra de instrumentos, degraus, extravasamentos grosseiros e perfurações.

A: Extravasamento na colocação de material obturador
B: Correção por meio de retratamento, seguido de apicectomia, curetagem e retrobturação apical.
(Fonte: HUPP et al, 2015)

Grandes Lesões periapicais não solucionadas com o tratamento do canal

Lesões perirradiculares muito grandes podem aumentar após o adequado desbridamento e obturação. Geralmente essas lesões são mais bem resolvidas com descompressão e curetagem limitada para evitar danificar as estruturas adjacentes como o nervo mandibular.

A: Aumento de área radiolúcida após o tratamento endodôntico convencional.
B: Tratamento por cirurgia apical com selamento retrógrado (Fonte: HUPP et al, 2015)

Contraindicações (Precauções)

  • Causa não identificada da falha do tratamento endodôntico
  • Quando o tratamento de canal convencional for possível
  • Tratamento coronal e cirurgia apical combinados
  • Quando o retratamento de um tratamento fracassado por possível
  • Estruturas anatômicas estão em risco (nervos e vasos)
  • Estruturas que interferem no acesso e na visibilidade
  • Comprometimento da proporção coroa-raiz
  • Complicações sistêmicas

O objetivo comum dos vários métodos cirúrgicos é promover a desinfecção apical não alcançada pela endodontia, entre eles, estão os mais citados pela literatura: a curetagem apical, a apicetomia e a obturação retrograda (XAVIER;ZAMBRANO, 2001).

A curetagem apical ou perirradicular consiste na remoção de tecido patológico ou corpo estranho (material obturador extravasado e fragmento de instrumento) junto à área apical que interfere no reparo (BRAMANTE; BERBERT, 1990).

Na apicetomia realiza-se a ressecção apical da raiz (3 mm do ápice radicular) e dos tecidos moles associados durante o procedimento cirúrgico (XAVIER; ZAMBRANO, 2001), eliminando-se os deltas apicais e possibilita uma melhor visualização do campo cirúrgico e processo patológicos locais, facilita a curetagem da loja ósseas e evita a recidiva da lesão. É indicado a utilização de motor cirúrgico (baixa rotação) e brocas multilaminadas, com inclinação dependente da necessidade de realizar (45º) ou não (90º) a retrobturação. Quanto necessário um ângulo de 45º facilita a visualização para inserção do material no canal principal.

Na obturação retrógrada ou retrobturação apical realiza-se uma cavidade no ápice radicular e sua obturação. Indicada em casos de fistulas ativas, canais inacessíveis, próteses e pinos, perfurações, instrumentos fraturados e dens in dente (BRAMANTE; BERBERT, 1990), objetivando o selamento hermético do canal principal. O material retrobturador deve ser biocompatível, promover a impermeabilidade do canal radicular remanescente e bactericida, sendo o MTA( Mineral Trioxide Aggregate), o material que melhor apresenta mais características próximas do ideal. O preparo da caixa apical deve ser mais profundo do que raza (auto-retentividade) e abranger todo o diâmetro do canal principal (selamento hermético).

A cicatrização da ferida operatória deve ser realizada em primeira intenção nas lojas operatórias menores que 2 cm livres de infecção, quando a loja é maior que 2 cm ou apresenta sinais de infecção, a cicatrização deve ser por segunda intenção. A proservação inicialmente em 1, 3 e 6 meses e anualmente até completar 05 anos, sendo a alta ambulatorial com a ausência de sintomas/sinais e achados radiográficos normais.

A cirurgia parendodôntica, portanto, tem como objetivo vedar todas os orifícios de entrada disponíveis no sistema de canais radiculares, removendo bactérias e suas toxinas, impedindo desta forma a contaminação dos tecidos periapicais. Não deve ser entendida como um substituto de um tratamento endodôntico convencional e sim como uma extensão da terapia endodôntica. A escolha para a realização da cirurgia parendodôntica deve ser baseada na avaliação de cada caso, no bom senso profissional, através de um diagnostico bem estabelecido e planejamento elaborado, sendo possível desta forma obter um prognóstico mais acertado e relatar ao paciente as suposições do que é possível acontecer.

Referências

SAYÃO, Sandra Endodontia: ciência, tecnologia e arte: do diagnóstico ao acompanhamento, 2 Ed, Ed Santos, 2007.

LEONARDO, M. R. Endodontia: tratamento de canais radiculares. São Paulo: Artes Médicas, 2008.

ORSO, VA; FILHO, MS. Cirurgia Parendodôntica: quando e como fazer. R. Fac. Odontol. Porto Alegre, Porto Alegre, v. 47, n.1, p. 20-23, 2006.

XAVIER, C.B.; ZAMBRANO, C.B.B. Avaliação da Ressecção Apical e Indicação de Materiais Retroobturadores em Cirurgias Parendodônticas no Brasil – Estudo de Campo. BCI: Rev. Bras. Cir. Implantodont., Curitiba, v.8, n.32, p.335-342. out./dez. 2001.

HUPP, J. R.; ELLIS, E. TUCKER, M. R. Cirurgia Oral e Maxilofacial Contemporânea. Elsevier, 6ed. 2015

BRAMANTE, C.M; BERBERT, A. Cirurgia Parendodôntica. Bauru, 1990